No processo de desenvolvimento do Curso de História do Cinema é possível perceber que as raízes remontam ao que ficou conhecido como realismo cinematográfico (pós II Guerra Mundial) e que incorporou-se no cinema documentário, muito utilizado como objeto de planejamento curricular nas escolas, nos dias atuais. Assim, entende-se que o cinema das primeira décadas eram tratados como possibilidade de reprodução do real de tal modo que a imagem mecânica foi identificada a partir de sua função de reprodutora da realidade, processo de identificação alimentado pela especificidade técnica da imagem reprodutível.
Em nossas escolas, o que se percebe é que o filme não é uma previsão curricular ou de planejamento didático pelo qual o professor incorporaria a dimensão estética e crítica da análise da película.
Mas, interessa a forma pela qual se trabalha pedagogicamente o filme com os aprendentes, considerando o gênero mais usual que é o documentário. O que se percebe é que os profissionais em educação iniciam pecando na ausência de um planejamento que evite o foco no enredo e na finalização, deixando de lado outros aspectos importantes de ordem estética, ideológica, econômica, social, política, entre outros; esquecendo inclusive que o documentário como arte cinematográfica é uma obra pessoal de seu realizador e que o documentarista não deve ser visto apenas como um meio para transmitir determinada realidade, o que significa que pelo fato de estabelecer um olhar próprio e subjetivo sobre determinado assunto, que um filme nunca é uma mera reprodução do mundo.
O produtor e o diretor existem no mundo e interagem com os outros, e sabe-se que o objetivo fundamental é apresentar uma visão sobre determinada realidade, seja uma visão própria ou imposta por determinado mecanismo do poder. Acima de tudo, um documentário transmite-nos, não a realidade, mesmo nos louváveis esforços em transmitir a realidade "tal qual" ela é, mas, essencialmente, o relacionamento que o documentarista estabelece com um tema. Por isso, ouvimos no decorrer do Curso de História de Cinema que existe identificação ideológica de classe, econômica, de poder, entre outros.
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Cena de "Ave Maria ou Mãe dos Sertanejos" (2009), de Camilo Cavalcante |
De certa forma, a leitura de imagem (incluindo o som, fotografias, enquadramento, etc.) soma-se à compreensão de que existe uma manipulação de imagens, somada ainda à exploração de todas as possibilidades expressivas da montagem e dos recursos sonoros, o que conduz ao grande questionamento de como documentar a realidade brasileira, uma vez que a mesma já é uma questão cultural, isto é, a questão de como deve ser a nossa cultura, e nesse caso, o filme, um elemento dessa cultura, uma proposta de solução para os impasses no desenvolvimento dessa cultura.
Creio que ainda estamos engatinhando no sentido de favorecer uma relação dialógica com o cinema em sala de aula, fugindo dos estereótipos impregnados na própria contracultura de não existir em nossas cidades uma cultura de cinema, enterrado com as salas Severiano Ribeiro que, na década de 1970 e início dos anos 1980 foi sendo substituído pela febre das discotecas, ou Dancing Days, mais atrativos para a juventude e, nos dias atuais, do cinema de super-heróis norte-americanos, do DVD pirata com filmes que expressam ou banalizam o horror, o mal caráter.
Se a realidade das capitais permanece inalterada em relação a cultura cinematográfica, no interior, as cidades tendem a viver a nostalgia de que um dia a realidade irá mudar. Esse traço marcante da influência ou imposição cultural estranha à realidade foi vista no filme Ave Maria ou Mãe dos Sertanejos (2009), quando a realidade final surge na lente cinematográfica, ou seja, crianças assistindo o cartoon Pica-Pau na televisão.