sexta-feira, 29 de abril de 2011

Resenha - O Baixio das Bestas, de Cláudio Assis

Baixio das Bestas - Um filme visceral de Cláudio Assis

É um filme brasileiro de 2007, do gênero drama, dirigido por Cláudio Assis. Tendo em seu elenco Mariah Teixeira(Auxiliadora), Fernando Teixeira(Seu Heitor), Caio Blat (Cícero), Matheus Nachtergaele (Everardo), Dira Paes (Dora), Marcélia Cartaxo (Ceiça), Hermila Guedes (Bela), Conceição Camarotti(Dona Margarida), João Ferreira(Mestre Mário), Irandhir Santos (Maninho), China (Cilinho), Samuel Vieira (Esdras).

O segundo filme do diretor a entrar no circuito nacional. Resultando diversos prêmios no festival de Brasília, entre outros. Uma desconfortante e profunda obra sobre os aqueles que vivem longe de grandes centros, sem perspectiva ou mesmo moral que guie suas atitudes. O filme divide-se em três núcleos da mesma comunidade.

Auxiliadora e seu avô, seu Heitor, vivem em situação humilde. Após o abandono da mãe, Auxiliadora ajuda à complementar a renda da casa lavando roupas pra fora e cuidando da casa e de seu Heitor. Esta cerceia qualquer liberdade normal a uma jovem de 16 anos por suas inclinações morais, arcaicas ao mundo atual. Entretanto este mesmo avô obriga a jovem a se exibir desnuda para caminhoneiros atrás de um prostíbulo para ajudar na complementação da renda. É evidente um sentimento de dependência projetado em sua neta gerado pelo abandono da filha. Ele a educa e protege, de acordo com seu ponto de vista, das tentações afora para evitar que ela siga o mesmo rumo da mãe.

Em outra parte temos Cícero e Everardo, criados desde a infância juntos. Everardo teve estudos financiados pela mãe de Cícero, mas desperdiçou a oportunidade com drogas e bebidas. Agora se aproxima de seu colega pra desfrutar dos luxos propiciados pela família de classe média que o vilipendia. Por suas faltas de perspectivas, vivem desregrados reunindo-se em bordeis ou no cinema abandonado da cidade.

No bordel de dona Margarida, trabalha e vive a inconformada Dora. Questionando suas amigas com seus gostos que contrastam com o cansaço de Bela e a apatia de Ceiça. Apesar de gostar de sua profissão, anseia por melhor nível de vida. Sempre desejosa de atenção, reclama do dia-a-dia no bordel, que em poucos momentos lhe proporciona alguma diversão em seu ofício. Acaba gerando muitos conflitos com sua opinião forte. Sai e torna-se presa fácil para os “Playboys da Zona da mata” Cícero e Everardo.

O filme retrata bem as pessoas se degradando em um ambiente de puro abandono e desespero velado. É desconfortante ao espectador ver esta faceta realista do aspecto humano. Mais doloroso é saber que tais histórias representadas ficcionalmente são facilmente cabíveis em regiões de miséria. Estas histórias poderiam ser inseridas numa ficção pós-apocalíptica, pós-guerra ou mesmo em comunidade bárbaras. Difícil é imaginar tais histórias a quilômetros de capitais urbanas ou patrimônios da humanidade.

Em certo momento da trama a queimada da cana trás a paisagem final dessa obra. Pode-se ter a impressão de se estar em um inferno digno das representações descritivas de Dante Alighieri. Os tormentos e torturas exibidos dão a impressão sobre a vida de cada personagem, sejam em maior ou menor grau. Em certos momentos o espectador pode vir a se questionar se as bestas mencionadas no título não seriam os personagens.

Alheio aos dramas dos personagens o filme levanta questões sobre a vida do cortador de cana. Seria errado viver de sua arte? Ou deve ele se reservar ao trabalho de sub-existência? Qual será o rumo daquela comunidade que reside nas decisões da Usina? Em um debate peculiar, regado à cachaça, Maninho e outros participantes discutem se é realmente válido continuar um trabalho miserável ou se deveriam viver apenas do Maracatu rural.

Enfim, em Baixio das Bestas, Cláudio Assis impõe um filme de difícil digestão. Principalmente pelo fato dos personagens serem parte daquela cena desolada e não terem, de forma alguma, como mudar seus destinos. Um filme cruelmente realista e direto.

Icaro Damon, Professor do projeto “Mais Educação”, Escola Cardeal Roncalli,Vitória de Santo Antão - PE

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